(*) Paula Ravanelli
A proposta de alterar o nome do Plenário da Câmara Municipal de Cubatão, atualmente denominado Dona Helena Meletti Cunha, para homenagear o vereador Wilson Pio, merece uma reflexão cuidadosa. Embora o reconhecimento à memória do vereador, falecido em 24 de abril de 2023, seja justo e digno, precisamos questionar a necessidade de apagar da história uma figura feminina tão relevante como Dona Helena, especialmente em uma sociedade ainda marcada pela falta de representação política das mulheres.
Dona Helena Meletti Cunha, a primeira Primeira-Dama de Cubatão, deixou um legado inquestionável na história do município. Desde 1959, seu nome está à frente do Plenário em reconhecimento ao trabalho social pioneiro que desenvolveu. Numa época em que as instituições de apoio ainda eram escassas e o Fundo Municipal de Solidariedade sequer existia, Dona Helena, com poucos recursos e muita determinação, dedicou-se a ajudar os mais carentes.
Seu compromisso e generosidade eram amplamente conhecidos e respeitados, o que fez de sua morte um momento de comoção profunda na cidade. Trocar o nome do Plenário significa muito mais do que uma simples mudança simbólica. Significa ignorar a contribuição histórica de uma mulher que, em uma época ainda mais desafiadora para a presença feminina na vida pública, dedicou-se às causas sociais com coragem e altruísmo. Esse ato é especialmente preocupante quando olhamos para a atual realidade política de Cubatão: atualmente, não há nenhuma mulher eleita para a Câmara Municipal.
Esse dado escancara a falta de representação feminina no Legislativo da cidade e reforça a urgência de preservar a memória de mulheres que abriram caminhos e lutaram, com suas próprias mãos, por uma sociedade mais justa. É importante salientar que essa discussão não se trata de comparar contribuições ou desmerecer a memória do vereador Wilson Pio, cujo legado também merece reconhecimento. No entanto, há formas alternativas de homenageá-lo sem apagar a história política e social de uma mulher que foi pioneira em sua época.
O que está em jogo aqui é a preservação da memória e do simbolismo que Dona Helena representa para Cubatão e, principalmente, para as mulheres da cidade. Apagar o nome de Dona Helena Meletti Cunha para colocar o de um homem é um reflexo direto do machismo estrutural que ainda impera em nossa classe política. Não podemos aceitar que, em pleno século XXI, o poder público reforce a invisibilidade feminina ao substituir uma homenagem à única mulher a ter seu nome em destaque no Plenário. Isso não é apenas uma mudança de placas; é um retrocesso simbólico que impacta diretamente as futuras gerações.
Preservar o nome de Dona Helena é preservar uma história de luta, dedicação e empatia. É um compromisso com a memória das mulheres que abriram caminho para outras, mesmo em tempos de tantas dificuldades. Cubatão merece manter viva essa memória e encontrar outras formas de homenagear figuras públicas importantes sem apagar aquelas que vieram antes e fizeram história. Não deixemos que o tempo apague o legado das mulheres em Cubatão. O nome de Dona Helena Meletti merece continuar no Plenário da Câmara Municipal como um lembrete constante do papel fundamental das mulheres cubatenses na construção de uma sociedade mais justa e solidária.
(*) Paula Ravaneli é procuradora municipal e ex-presidente do Conselho Municipal da Condição Feminina de Cubatão.
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