Por Marcio Aurerlio Soares*
Não faz muito tempo, a cozinha era espaço doméstico quase que exclusivo das mulheres, que, socialmente, cabia-lhes a incumbência de cozinhar, lavar, passar e cuidar dos filhos. Esse era o entendimento do legislador quando aprovou, em 1958, pensão vitalícia para as mulheres solteiras, maiores de 21 anos, filhas de servidores públicos em cargos permanentes, com a justificativa de que estas, na ausência do pai, não teriam o marido para sustenta-las.
Apesar da Constituinte de 1988 ter eliminado essa aberração, a imprensa noticia essa semana, que ainda hoje existem 60 mil delas, por direito garantido, que somam 3 bilhões de reais ao ano em despesas ao erário público, com pensões que chegam a 39 mil reais por mês. Legal, mas imoral. Motivo para a marginalização do servidor público. É servidor, é marajá. É certo que a média salarial entre os 600 mil servidores públicos federais é maior que o seu correspondente na esfera privada, que, segundo o IPEA – Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, foi de R$7.400 por mês no ano de 2021. É muito? Não é o que parece ser.
É necessário estabelecer, de ante mão, que média, é média, o que significa dizer, que nem todo servidor ganha esta quantia. Há grandes distorções entre os três poderes. Segundo o Atlas do Estado Brasileiro, em 2019, a média salarial de magistrados e servidores do judiciário, foi de R$12.115 reais; no legislativo, de R$6.011; enquanto que no executivo, essa média ficou em R$4,026. Ainda assim, maior que a média salarial na iniciativa privada, de R$ 2.350, segundo a PNAD Contínua – Pesquisa Nacional por Amostragem de Domicílio em 2022. Vale lembrar que o servidor público não tem FGTS – Fundo de Garantia por Tempo de Serviço, como os empregados na inciativa privada. Ah, mas eles têm estabilidade, diria você.
Certo e necessária, pois são servidores de Estado, e não de governo, o que lhes confere autonomia e discricionariedade, que não teriam ser estivessem atrelados a um mandatário-padrinho que o tivesse nomeado. Esta independência, por exemplo, ficou evidente por ocasião da apreensão das joias do ex-presidente Jair Bolsonaro e sua esposa, no aeroporto de Guarulhos. Tivessem sido eles nomeados em cargo de confiança do ex-presidente infrator, estariam no olho da rua.
A despeito das argumentações apresentadas acima, o leitor deve estar matutando, “mas também, a quantidade de servidores no Brasil, é um absurdo”. Não é! Segundo a OCDE – Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico, uma espécie de clube de países ricos, a média de servidores públicos em relação a força total de trabalho no Brasil é de 12,5%, abaixo da média mundial de 17,88%. É pública a informação de que incluindo as esferas federal, estadual e municipal temos em torno de 3,2 milhões de servidores públicos, cerca de 1,6% da população brasileira, e que país como a Espanha, tem 15,7%, Noruega, 30%; e, os EUA, o berço do capitalismo, portanto, da iniciativa privada, tem 15,3% de servidores em relação à sua população total. Esses dados são irrefutáveis, bastando, por fim, comentarmos sobre a qualidade desses serviços.
A Agência Brasil, uma agência de comunicação pública, de novembro de 2022, dá a saber que o Brasil, “é um dos líderes mundiais na digitalização de serviços públicos”. Diz a matéria que o Banco Mundial analisou 198 países, tendo sido o Brasil reconhecido como o segundo país mais avançado do mundo em governança digital. “Carteira digital de trabalho, CNH digital, acesso a sistemas como o ENEM, SISU, INSS e FIES, todos serviços de forte impacto econômico-social, são hoje facilmente acessados por intermédio da plataforma gov.br”, e continua afirmando que tal iniciativa gera cerca de 4,6 bilhões de reais ao ano de economia para os cofres públicos, além da segurança e proteção de dados.
Não sei se o contribuinte tem isso claro, mesmo que, segundo a mesma agência de notícias, em 2021, tivéssemos 152 milhões de brasileiros com acesso a internet, pois sabemos que em sua grande maioria a qualidade dessa conexão é muito ruim, e a escolaridade de nossos irmãos ainda é muito baixa. O fato é que temos muito que avançar, sabendo que a qualidade desses serviços vai melhorar na medida da participação da sociedade em seu controle.
*Médico
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