José Manoel Ferreira Gonçalves
Em que pesem todos os sinais emitidos pela natureza, tragédias como a de Capitólio (MG) se repetem há décadas no Brasil, sem que as autoridades, empresas e a própria população respeitem os limites da ocupação do solo, da exploração turística e da sustentabilidade. Há nove anos, tivemos aqui entre nós mais um exemplo dessa insensatez.
Em fevereiro de 2013, um deslizamento de terra provocado por um forte temporal bloqueou a entrada de um dos túneis da rodovia dos Imigrantes, na altura de Cubatão, atingindo 24 veículos. Um grande volume de lama deslizou pela lateral do túnel e caiu por sobre os carros que transitam naquele momento, provocando a morte de uma mulher. O estrago poderia ter sido muito maior, inclusive, se os detritos atingissem os pilares do viaduto.
Houve comoção generalizada e o governador sobrevoou a região, mas, de concreto, nenhuma providência foi tomada para evitar novas catástrofes como aquela. Pior: o governo chegou a anunciar que iria apurar a responsabilidade da concessionária gestora da rodovia, mas até hoje não se sabe se essas providências legais foram adiante, muito menos se houve uma conclusão dessas investigações.
Como sempre, as autoridades culparam as forças incontroláveis da natureza para justificar sua inoperância diante da calamidade, que, ressalte-se, na grande maioria dos casos, pode ser evitada. A história se repete agora em Capitólio, onde o prefeito tentou se defender sobre a falta de estudos geológicos sobre a região em que um grande bloco de pedra se desprendeu e atingiu embarcações de turistas, com o argumento de que nenhuma ocorrência do gênero tinha sido registrada até então. Ora, os estudos de risco servem exatamente para antecipar os fatores que podem vir a causar uma tragédia. Isso se chama prevenção – e é responsabilidade do Estado.
A Baixada Santista concentra uma série de riscos que são potencializados em época de chuvas, e essa não é uma mera especulação. Dados de um levantamento feito pela Secretaria do Estado de Infraestrutura e Meio Ambiente apontam para vários pontos críticos na região, oriundos da ocupação desregrada do solo (inclusive em áreas de morro), da falta de saneamento básico e do desmatamento. Podemos acrescentar a esses fatores a exploração habitacional e turística desenfreada, fruto em boa parte da ausência de Plano Diretor integrado, que contemple, entre outras diretrizes, a necessidade de preservação das áreas de vegetação, mangues, restingas e dunas.
O alerta vem das águas e rochas mineiras, e também do histórico de infortúnio da Baixada: não podemos ser indulgentes com a natureza em nossa região. Precisamos cobrar das autoridades o respeito ao ambiente que nos cerca.
José Manoel Ferreira Gonçalves é mestre e doutor em engenharia, advogado, jornalista e escritor. E presidente da FerroFrente (Frente Nacional pela volta das Ferrovias) e da Associação Guarujá Viva (Aguaviva). Diretor da Federação Nacional dos Engenheiros (FNE) e da Confederação Nacional dos Trabalhadores Liberais Universitários Regulamentados (CNTU).
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